4 de maio de
2013 às 15:56
MINISTÉRIO DA
EDUCAÇÃO
Secretaria de
Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão - Diretoria de
Políticas de Educação Especial - NOTA TÉCNICA Nº 24 / 2013 / MEC / SECADI /
DPEE Data: 21 de março de 2013.
Assunto:
Orientação aos Sistemas de Ensino para a implementação da Lei nº 2.764/2012
A Lei nº
12.764/2012 institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com
Transtorno do Espectro Autista, atendendo aos princípios da Política Nacional
de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (MEC/2008) e ao
propósito da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – CDPD
(ONU/2006), definidos no seu art. 1º, nos seguintes termos:
O propósito
da presente Convenção é promover, proteger e assegurar o exercício pleno e
equitativo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as
pessoas com deficiência e promover o respeito pela sua dignidade inerente.
De acordo com
o §2º, do art. 1º da Lei nº 12.764/2012, a pessoa com transtorno do espectro
autista é considerada pessoa com deficiência. Conforme a CDPD (ONU/2006):
Pessoas com
deficiência são aquelas que tem impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas
barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em
igualdade de condições com as demais pessoas.
Dentre as
diretrizes para a consecução do objetivo da Lei nº 12.764/2012, estabelecidas
no art. 2º, destacam-se aquelas que tratam da efetivação do direito à educação:
I - a
intersetorialidade no desenvolvimento das ações e das políticas e no
atendimento à pessoa com transtorno do espectro autista;
II - a
participação da comunidade na formulação de políticas públicas voltadas para as
pessoas com transtorno do espectro autista e o controle social da sua
implantação, acompanhamento e avaliação; [...]
V - o
estímulo à inserção da pessoa com transtorno do espectro autista no mercado de
trabalho, observadas as peculiaridades da deficiência e as disposições da Lei
nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente);
VII – o
incentivo à formação e à capacitação dos profissionais especializados no
atendimento á pessoa com transtorno do espectro autista, bem como pais e
responsáveis; [...]
Tais
diretrizes coadunam-se com os seguintes objetivos da Política Nacional de
Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva:
-
Transversalidade da educação especial desde a educação infantil até a educação
superior;
- Atendimento
Educacional Especializado;
-
Continuidade da escolarização nos níveis mais elevados de ensino;
- Formação de
professores para o atendimento educacional especializado e demais profissionais
da educação para a inclusão escolar;
-
Participação da família e da comunidade;
-
Acessibilidade urbanística, arquitetônica, nos mobiliários, equipamentos, nos
transportes, na comunicação e informação;
- Articulação
intersetorial na implementação das políticas públicas.
A
intersetorialidade na gestão das políticas públicas é fundamental para a
consecução da inclusão escolar, considerando a interface entre as diferentes
áreas na formulação e na implementação das ações de educação, saúde,
assistência, direitos humanos, transportes, trabalho, entre outras, a serem
disponibilizadas às pessoas com transtorno do espectro autista.
A
participação da comunidade na formulação, implantação, acompanhamento e
avaliação das políticas públicas constitui um dos mecanismos centrais para a
garantia da execução dessa política, de acordo com os atuais preceitos legais,
políticos e pedagógicos que asseguram às pessoas com deficiência o acesso a um
sistema educacional inclusivo em todos os níveis.
A formação
dos profissionais da educação possibilitará a construção de conhecimento para
práticas educacionais que propiciem o desenvolvimento sócio cognitivo dos
estudantes com transtorno do espectro autista. Nessa perspectiva, a formação
inicial e continuada deve subsidiar os profissionais, visando à/ao:
- Superação
do foco de trabalho nas estereotipias e reações negativas do estudante no
contexto escolar, para possibilitar a construção de processos de significação
da experiência escolar;
- Mediação
pedagógica nos processos de aquisição de competências, por meio da antecipação
da organização das atividades de recreação, alimentação e outras, inerentes ao
cotidiano escolar;
- Organização
de todas as atividades escolares de forma compartilhada com os demais
estudantes, evitando o estabelecimento de rituais inadequados, tais como:
horário reduzido, alimentação em horário diferenciado, aula em espaços
separados;
-
Reconhecimento da escola como um espaço de aprendizagem que proporciona a
conquista da autonomia e estimula o desenvolvimento das relações sociais e de
novas competências, mediante as situações desafiadoras;
- Adoção de
parâmetros individualizados e flexíveis de avaliação pedagógica, valorizando os
pequenos progressos de cada estudante em relação a si mesmo e ao grupo em que
está inserido;
-
Interlocução permanente com a família, favorecendo a compreensão dos avanços e
desafios enfrentados no processo de escolarização, bem como dos fatores
extraescolares que possam interferir nesse processo;
- Intervenção
pedagógica para o desenvolvimento das relações sociais e o estímulo à
comunicação, oportunizando novas experiências ambientais, sensoriais,
cognitivas, afetivas e emocionais;
-
Identificação das competências de comunicação e linguagem desenvolvidas pelo
estudante, vislumbrando estratégias visuais de comunicação, no âmbito da
educação escolar, que favoreçam seu uso funcional no cotidiano escolar e demais
ambientes sociais;
-
Interlocução com a área clínica quando o estudante estiver submetido a
tratamento terapêutico e se fizer necessária a troca de informações sobre seu
desenvolvimento;
-
Flexibilização mediante as diferenças de desenvolvimento emocional, social e
intelectual dos estudantes com transtorno do espectro autista, possibilitando
experiências diversificadas no aprendizado e na vivência entre os pares;
-
Acompanhamento das respostas do estudante frente ao fazer pedagógico da escola,
para a aquisição de conhecimentos e o desenvolvimento de competências,
considerando a multiplicidade de dimensões que envolvem a alfabetização, a
resolução das tarefas e as relações interpessoais, ao longo da escolarização;
- Aquisição
de conhecimentos teóricos-metodológicos da área da Tecnologia Assistiva,
voltada à Comunicação Alternativa/Aumentativa para estes sujeitos.
Planejamento
e organização do atendimento educacional especializado considerando as
características individuais de cada estudante que apresenta transtornos do
espectro autista, com a elaboração do plano de atendimento objetivando a
eliminação de barreiras que dificultam ou impedem a interação social e a
comunicação.
A
implementação da diretriz referente à inserção das pessoas com transtorno do
espectro autista no mercado de trabalho remete ao princípio da política de
inclusão escolar das pessoas com deficiência, cuja finalidade é assegurar o
acesso à educação em todos os níveis, etapas e modalidades, promovendo as
condições para sua inserção educacional, profissional e social. É fundamental
reconhecer o significado da inclusão para que as pessoas com transtorno do
espectro autista tenham assegurado seu direito à participação nos ambientes
comuns de aprendizagem, construindo as possibilidades de inserção no mundo do
trabalho.
Esse
princípio é congruente com o teor do art. nº 27 da CDPD (ONU/2006) que
preconiza o direito da pessoa com deficiência ao exercício do trabalho de sua
livre escolha, no mercado laboral, em ambiente inclusivo e acessível.
Para a
realização do direito das pessoas com deficiência à educação, o art. 24 da CDPD
(ONU/2006) estabelece que estas não devem ser excluídas do sistema regular de
ensino sob alegação de deficiência, mas terem acesso a uma educação inclusiva,
em igualdade de condições com as demais pessoas, na comunidade em que vivem e
terem garantidas as adaptações razoáveis de acordo com suas necessidades
individuais, no contexto do ensino regular, efetivando-se, assim, medidas de
apoio em ambientes que maximizem seu desenvolvimento acadêmico e social, de
acordo com a meta de inclusão plena.
Para a
garantia do direito à educação básica e, especificamente, à educação
profissional, preconizado no inciso IV, alínea a, do artigo 3º da Lei nº
12.764/2012, os sistemas de ensino devem efetuar a matrícula dos estudantes com
transtorno do espectro autista nas classes comuns de ensino regular,
assegurando o acesso à escolarização, bem como ofertar os serviços da educação
especial, dentre os quais: o atendimento educacional especializado complementar
e o profissional de apoio.
No art. 3º,
parágrafo único, a referida lei assegura aos estudantes com transtorno do
espectro autista, o direito à acompanhante, desde que comprovada sua
necessidade. Esse serviço deve ser compreendido a luz do conceito de adaptação
razoável que, de acordo com o art. 2º da CDPD (ONU/2006), são:
“[...] as
modificações e os ajustes necessários e adequados que não acarretem ônus
desproporcional ou indevido, quando requeridos em cada caso, a fim de assegurar
que as pessoas com deficiência possam gozar ou exercer, em igualdade de
oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos humanos e liberdades
fundamentais.”
O serviço do
profissional de apoio, como uma medida a ser adotada pelos sistemas de ensino
no contexto educacional deve ser disponibilizado sempre que identificada a
necessidade individual do estudante, visando à acessibilidade às comunicações e
à atenção aos cuidados pessoais de alimentação, higiene e locomoção. Dentre os
aspectos a serem observados na oferta desse serviço educacional, destaca-se que
esse apoio:
- Destina-se
aos estudantes que não realizam as atividades de alimentação, higiene,
comunicação ou locomoção com autonomia e independência, possibilitando seu
desenvolvimento pessoal e social;
-
Justifica-se quando a necessidade específica do estudante não for atendida no
contexto geral dos cuidados disponibilizados aos demais estudantes;
- Não é
substitutivo à escolarização ou ao atendimento educacional especializado, mas
articula-se às atividades da aula comum, da sala de recursos multifuncionais e
demais atividades escolares;
- Deve ser
periodicamente avaliado pela escola, juntamente com a família, quanto a sua
efetividade e necessidade de continuidade.
A organização
dos serviços de apoio deve ser prevista pelos sistemas de ensino, considerando
que os estudantes com transtorno do espectro autista devem ter oportunidade de
desenvolvimento pessoal e social, que considere suas potencialidades, bem como
não restrinja sua participação em determinados ambientes e atividades com base
na deficiência. No processo de inclusão escolar dos estudantes com transtorno
do espectro autista é fundamental a articulação entre o ensino comum, os demais
serviços e atividades da escola e o atendimento educacional especializado –
AEE.
O AEE foi
instituído pelo inciso 3º, do art. 208, da Constituição Federal/1988 e definido
no §1º, art. 2º, do Decreto nº 7.611/2011, como conjunto de atividades,
recursos de acessibilidade e pedagógicos, organizados institucionalmente e
prestados de forma complementar ou suplementar à escolarização. Conforme
Resolução CNE/CEB nº 4/2009, que dispõe sobre as Diretrizes Operacionais para o
Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica, a função desse
atendimento é identificar e eliminar as barreiras no processo de aprendizagem,
visando à plena participação.
A
institucionalização da oferta do AEE no Projeto Político Pedagógico – PPP da
escola considera a flexibilidade desse atendimento realizado individualmente ou
em pequenos grupos, conforme Plano de AEE de cada estudante. O Plano de AEE do
estudante com transtorno do espectro autista contempla: a identificação das
habilidades e necessidades educacionais específicas; a definição e a
organização das estratégias, serviços e recursos pedagógicos e de acessibilidade;
o tipo de atendimento conforme as necessidades de cada estudante; o cronograma
do atendimento e a carga horária, individual ou em pequenos grupos.
O professor
do AEE acompanha e avalia a funcionalidade e a aplicabilidade dos recursos
pedagógicos e de acessibilidade na sala de aula comum e nos demais ambientes da
escola, considerando os desafios que estes vivenciam no ensino comum, os
objetivos do ensino e as atividades propostas no currículo, de forma a ampliar
suas habilidades, promovendo sua aprendizagem. Este atendimento prevê a criação
de redes intersetoriais de apoio à inclusão escolar, envolvendo a participação
da família, das áreas da educação, saúde, assistência social, dentre outras,
para a formação dos profissionais da escola, o acesso a serviços e recursos
específicos, bem como para a inserção profissional dos estudantes.
A modalidade
da educação especial disponibiliza o atendimento educacional especializado -
AEE, os demais serviços e recursos pedagógicos e de acessibilidade, contemplando
a oferta de profissional de apoio, necessário à inclusão escolar do estudante
com transtorno do espectro autista, nas classes comuns do ensino regular, nas
escolas públicas e privadas. Os serviços da educação especial constituem oferta
obrigatória pelos sistemas de ensino, em todos os níveis, etapas e modalidades,
devendo constar no PPP das escolas e nos custos gerais da manutenção e do
desenvolvimento do ensino.
Os
professores das classes comuns e os do AEE devem manter interlocução permanente
com o objetivo de garantir a efetivação da acessibilidade ao currículo e um
ensino que propicie a plena participação de todos. Para o cumprimento de seus
objetivos, o AEE não poderá prescindir de tal articulação, devendo os
profissionais do turno de matrícula do aluno proporcionar condições para que
tal articulação seja possível.
As
instituições de ensino privadas, submetidas às normas gerais da educação
nacional, deverão efetivar a matrícula do estudante com transtorno do espectro
autista no ensino regular e garantir o atendimento às necessidades educacionais
específicas. O custo desse atendimento integrará a planilha de custos da
instituição de ensino, não cabendo o repasse de despesas decorrentes da
educação especial à família do estudante ou inserção de cláusula contratual que
exima a instituição, em qualquer nível de ensino, dessa obrigação.
Para apoiar o
desenvolvimento inclusivo das redes públicas de ensino, visando assegurar a
matrícula, organizar e disponibilizar os serviços da educação especial na perspectiva
da educação inclusiva, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação
Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação - FUNDEB prevê valor
diferenciado de 1,20, no mínimo, para estudantes público alvo da educação
especial matriculados nas classes comuns do ensino regular das redes públicas e
2,40, no mínimo, para a dupla matrícula, ou seja, uma na educação básica
regular e outra no atendimento educacional especializado.
Considerando
que a recusa de matrícula e o não atendimento às necessidades
educacionais
específicas dos estudantes, fere o dispositivo constitucional que assegura o
direito à inclusão escolar, recomenda-se que tal fato seja comunicado ao
Ministério Público, bem como ao Conselho de Educação, no âmbito municipal,
estadual ou federal, responsável pela autorização de funcionamento da
respectiva instituição de ensino, pública ou privada, a fim de que se proceda à
instrução de processo de adequação ou de descredenciamento da instituição de
ensino, bem como aplicação das penalidades previstas no art. 7º da Lei nº
12.764 ao gestor escolar ou autoridade competente que recusar a matrícula do
estudante com
transtorno do
espectro autista.
Martinha
Clarete Dutra dos Santos
Diretora de
Políticas de Educação Especial
DPEE / SECADI
/ MEC
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